Mário C. Salvador é co-diretor do ALECES, Instituto de Psicoterapia Integrativa Traumática e Brainspotting Espanha, palestrante e autor do livro Beyond the Self: Healing Emotional Trauma and Brainspotting e co-autor do livro The Power of Brainspotting.

Mário C. Salvador: uma conversa sobre saúde mental

O assunto do nosso diálogo é em relação à segunda edição do livro “Mais além do eu”, que aprofunda como nossos traumas emocionais podem impactar a ideia de quem somos.
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Texto: Thalía Magalhães

Como escritora de livros relacionados à ansiedade, tive o privilégio de conversar com o primeiro autor internacional da Editora Escreva, Mário C. Salvador, ele é psicólogo e especialista em psicologia clínica, com 36 anos de experiência na prática da psicoterapia e é, ainda, um autor best seller com obras publicadas em mais de três idiomas.

Ele veio diretamente de Barcelona para o lançamento da segunda edição do seu livro “Mais além do eu”. Tivemos a honra de inaugurar a revista com uma autoridade no quesito bem-estar psicológico.

Uma pauta tão importante como a saúde mental se faz mais que necessária ser discutida nestes últimos tempos. Para isso, nada melhor para se aprofundar um pouco mais nesse assunto que um bate-papo a respeito da contribuição profissional de Mário Salvador para essa área.

Mário C. Salvador é co-diretor do ALECES, Instituto de Psicoterapia Integrativa Traumática e Brainspotting Espanha., ele é Treinador Internacional em Psicoterapia Integrativa pelo IIPA, Professor e Supervisor de Análise Transacional (EATA-ITAA), Treinador e Supervisor em Brainspotting pelo BTI e Clínico EMDR. Também é o atual presidente da Associação Espanhola de Brainspotting e vice-presidente da Associação Iberoamericana de Psicotrauma (AIBAPT). Codiretor e principal professor do Seminário de Desenvolvimento Profissional sobre Integração e Reprocessamento de Trauma do Método Aleceia do Instituto Aleces e professor internacional no Brasil, Itália, Eslovênia, Equador, Romênia, Rússia e Áustria. Além de ser palestrante e autor do livro Beyond the Self: Healing Emotional Trauma and Brainspotting e co-autor do livro The Power of Brainspotting.
  1. Com o objetivo de conectar o maior número de pessoas, especialistas procuram escrever livros. Durante sua carreira profissional, qual foi a sua grande motivação para escrever livros?

Bem, ao longo de minha carreira profissional, venho integrando uma maneira de fazer e ler experiências dolorosas. E, nos últimos 25 anos, venho ensinando e treinando outros terapeutas. Tenho a vocação de ensinar e disseminar o conhecimento. Então, em um determinado momento, senti que tinha muito a compartilhar e daí surgiu a ideia de escrever um livro que pudesse conter os aspectos mais essenciais da minha integração para que pudesse alcançar mais pessoas e, também, ser um texto que complementasse meus ensinamentos.

  1. No Brasil, a segunda edição da obra “Mais além do e  u” está sendo lançada. Pode nos dizer do que se trata o seu livro?

É um livro que oferece uma visão ampla e panorâmica da abordagem do trauma emocional. Ele traça a jornada de como estamos construindo “nossas ideias do eu”, que são elaboradas por meio da qualidade das experiências relacionais que temos, especialmente, com os cuidadores primários. Desenvolvo, detalhadamente, o papel do relacionamento terapêutico na cura, ajudando a pessoa a se reconectar com sua experiência, da qual ela quis fugir por ser dolorosa. Explico, também, como o Brainspotting é uma técnica de atenção plena muito focada que permite uma metabolização muito profunda e corporal do trauma para que ele possa finalmente ser transformado e, ainda, ilustro como trabalhar a partir dessa técnica. Além de ter um capítulo que foi acrescentado nessa segunda edição, sobre um novo conceito que cunhei em meu ensino – a escuta límbica do terapeuta que quer dizer: a capacidade de ler a vida oculta que está em nossa linguagem somato-emocional. Por fim, exponho um modelo de funil para aprender a ver a vida emocional que está por trás das palavras como uma forma de desenvolver maior sintonia com o mundo interior do paciente.

  1. O que os leitores poderão aprender com o seu livro “Mais além do eu”?

Os leitores terão uma visão muito ampla, abrangente e panorâmica do fenômeno da dor emocional não digerida em nossas vidas e de como lidar com ela em sua complexidade. A intenção é promover um insight profundo que ajude a acessar nossa dor enterrada de uma forma gentil e muito transformadora. Somente transformando nossa sensação sentida no corpo de quem somos é que seremos capazes de encontrar uma nova maneira de lidar com ela.

  1. Como ocorreu o processo de tradução do seu livro para outros países? Em quais países os seus livros são distribuídos?

A primeira tradução do meu livro foi para o português, porque há alguns anos eu treinava colegas psicoterapeutas no Brasil. Esly Carvalho, a organizadora que me trouxe, teve interesse em realizar a primeira edição. Posteriormente, fiz a tradução para o inglês, já que meu trabalho também era conhecido nos EUA; isto foi feito pela mesma editora do meu livro em espanhol. E, ainda em 2024, será lançada a tradução para a língua russa, pois também tenho uma extensa comunidade de alunos na Rússia.

  1. Como o senhor avalia o mercado editorial brasileiro?

O mercado brasileiro é muito importante, pois é um país com uma grande cultura de psicoterapia. Muitos terapeutas estão intensamente envolvidos no aprendizado sobre diferentes abordagens que podem ajudar a curar traumas emocionais. Espero que esse livro ajude uma comunidade que é tão valiosa.

  1. No contexto da internacionalização, quais são os principais desafios?

Acho que o desafio mais importante é fazer com que os autores que não são da cultura anglo-saxônica saibam que temos um conhecimento muito valioso e rigoroso que visa trazer contribuições para o mundo da psicoterapia. Uma vez que é uma cultura muito produtiva e que também possui excelentes meios de promoção e marketing. É tarefa dos editores e dos autores criarem espaços para mostrar autores não tão midiáticos.

  1. Recentemente, o senhor lançou um livro na Europa, Las dos caras de Nina pelo grupo editorial Comanegra. Do que se trata essa obra e qual é a importância dela para a área da psicologia e da psicoterapia?

Nesse livro, escrito em uma linguagem acessível a toda a população e, também, curto, trato do fenômeno do trauma e da dissociação (desconexão consigo mesmo). Faço isso por meio dos diálogos de Nina, uma menina de 20 anos, com seu terapeuta. Há uma parte de Nina que leva uma vida aparentemente normal, como uma estudante universitária que administra seus estudos e alguma vida social de forma aceitável. Ao mesmo tempo em que passa por momentos de intensa depressão e tristeza até com pensamentos suicidas. A segunda parte do livro é um epílogo, o qual ensina em quatro seções a respeito de traumas e dores emocionais, assim como traz questões para reflexão pessoal.

  1. Sabemos que a saúde mental é um problema global. Então, na sua visão, por que as pessoas estão adoecendo emocionalmente?

Temos criado uma cultura e um sistema de vida muito distantes do que é natural para a condição humana. Somos seres de relacionamentos e de tribo. O sistema de vida no nosso mundo ocidental foi organizado para promover sociedades produtivas. Desde muito jovem, na educação, a fonte de valor e de autoestima está focada no desempenho e na obtenção de sucesso e de riqueza. Isso se faz ao preço de se sacrificar a atenção à nossa vida emocional e às relações interpessoais fundamentadas no afeto, na solidariedade e no altruísmo, qualidades que nos tornam mais humanos. Criamos a sociedade que mais precisa das drogas para regular a sua vida, que tem mais violência, depressão e vidas vividas sem sentido profundo. O homem tornou-se um predador do próprio homem, e isso é um absurdo.

  1. Como os traumas emocionais contribuem para o aumento da prevalência?

O trauma é uma reação do nosso corpo que foi consertada para sobreviver. A partir daqui, afeta a forma como definimos a nós mesmos, aos outros e à vida; e, geralmente, com um conceito doloroso que está na raiz de todos os problemas de saúde mental. Hoje, a investigação em neurociências apoia a forma como a traumatização ao longo do desenvolvimento e na nossa vida cotidiana afeta a nossa biologia, nossa bioquímica, nosso desempenho e nossa capacidade de relações sociais. É lógico sabermos que o sistema nervoso reage e se organiza às circunstâncias do ambiente e, principalmente, às relações em que vivemos.

  1. De qual forma a técnica de Brainspotting contribui para a cura desses traumas emocionais?

O Brainspotting acessa a experiência somática de forma profunda e localizada, que permite que a nossa história [fique] registrada no corpo entregue as informações que nunca foi capaz de contar. Dessa forma, o Brainspotting possibilita promover um processo de atenção plena ou de auto-observação interna a fim de abraçar a nossa experiência que vem do passado e que ainda não foi completada e transformada. E poder observar a nossa experiência com um olhar bondoso e amoroso significa que ela pode, finalmente, terminar e transformar-se, consolidando-se de uma nova forma em nós; assim, a nossa percepção de nós mesmos, dos outros e da vida mudará.

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