Foto: NUCOM/Uniesp
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Formar para cuidar

Primeira pós-graduação do Brasil em doenças raras, oferecida pelo UNIESP, na Paraíba, marca avanço inédito na formação de profissionais de saúde capacitados para atender milhões de brasileiros.
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Reportagem: Guilherme Vicente de Morais

Pouco se fala sobre doenças raras durante a formação tradicional em saúde. Menos ainda se prepara para elas. Enquanto o Brasil convive com cerca de 13 milhões de pessoas diagnosticadas com uma das mais de 8 mil doenças classificadas como raras pela OMS (Organização Mundial da Saúde), a ausência de profissionais qualificados para atuar nesse campo se tornou um dos maiores gargalos do SUS (Sistema Único de Saúde). Faltam médicos geneticistas – estimados em menos de 400 para todo o território nacional – mas também há escassez de enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos e tantos outros profissionais de saúde necessários para o tratamento multidisciplinar da pessoa com doença rara, com preparo técnico e sensibilidade para lidar com essas patologias.

Campus do Uniesp, instituição paraibana que se destaca na formação de profissionais capacitados para os desafios das doenças raras. Fotos: NUCOM/Uniesp
Campus do Uniesp, instituição paraibana que se destaca na formação de profissionais capacitados para os desafios das doenças raras. Fotos: NUCOM/Uniesp
Erika Marques, reitora do Uniesp. Foto: Ianca Sobrinho
Erika Marques, reitora do Uniesp. Foto: Ianca Sobrinho

Foi para mudar esse cenário que o Centro Universitário UNIESP, na Paraíba, criou a primeira pós-graduação do Brasil voltada exclusivamente às doenças raras. O curso multidisciplinar forma profissionais de diversas áreas para compreender e acolher de maneira integral as especificidades desses pacientes. “Nosso compromisso é com a transformação. A especialização nasceu da urgência de formar pessoas preparadas para lidar com o que há de mais negligenciado na saúde pública”, afirma a reitora Erika Marques. A iniciativa reforça o papel social e a missão da instituição: “antecipar tendências, responder a desafios sociais com soluções concretas e formar líderes capazes de transformar realidades”. 

Jeane Cavalcante, coordenadora da pós-graduação em Doenças Raras do Uniesp. Foto: Pedro Augusto Sarmento
Jeane Cavalcante, coordenadora da pós-graduação em Doenças Raras do Uniesp. Foto: Pedro Augusto Sarmento

A estrutura do curso é dividida em três pilares: técnico-assistencial, científico e humanístico. As aulas vão desde políticas públicas até bioética e terapias integrativas. “Preparamos os alunos para atuarem desde a atenção básica até os centros de referência, com um olhar sistêmico e empático”, explica Jeane Cavalcante, professora e coordenadora da pós. Ela relata que os alunos se surpreendem com a quantidade de doenças raras existentes e o impacto que elas têm não apenas sobre o paciente, mas sobre toda a rede de apoio familiar e social.

Esse foi justamente o ponto que marcou a experiência da psicóloga Juliana Prazeres, aluna egressa do curso. “O paciente raro não vem sozinho. Ele traz uma família emocionalmente fragilizada. Precisamos conhecê-los para sermos mais do que técnicos e oferecer o acolhimento adequado”, conta. Para ela, o vínculo terapêutico se fortalece quando o profissional entende os diagnósticos e fala a mesma língua dos familiares, que são quem de fato acompanham o paciente raro em toda a sua jornada.

Lidiane Bezerra, fisioterapeuta e mãe de uma criança com Síndrome de Rett, está na turma atual e reforça que a formação muda a maneira de cuidar. “Aprendemos que diagnóstico não é destino. Cada paciente precisa ser visto em sua singularidade. Isso tem impacto direto na qualidade de vida e no encurtamento da jornada até o diagnóstico e o tratamento da doença”. Ela acredita que a formação deve ser levada para todo o Brasil já que “a carência de profissionais capacitados é gritante em todos os lugares.”

Saionara Araújo, diretora do Centro de Referência Multiprofissional em Doenças Raras de João Pessoa, Paraíba. Foto: Paulo Bandeira
Saionara Araújo, diretora do Centro de Referência Multiprofissional em Doenças Raras de João Pessoa, Paraíba. Foto: Paulo Bandeira

Quem compartilha dessa visão é Saionara Araújo, diretora do Centro de Referência Multiprofissional em Doenças Raras de João Pessoa. Para ela, a pós-graduação rompe com a zona de conforto dos profissionais e os estimula a rever conceitos. “É uma formação que deveria ser replicada pelos quatro cantos do país. Profissionais capacitados aliviam não só a dor dos pacientes, mas também o peso sobre as famílias, que muitas vezes carregam fardos maiores que suas forças.”

A experiência e a capacitação oferecida pelo curso, evidencia um caminho possível no enfrentamento de um dos principais desafios do SUS: A falta de profissionais preparados para atuar com doenças raras. A criação de especializações como a ofertada pelo Uniesp, bem como incentivos à formação de médicos geneticistas no Brasil, são medidas urgentes que precisam ser tomadas. É preciso também reconhecer que cuidar bem dos raros exige hoje preparo técnico, políticas públicas eficazes e o compromisso dos gestores públicos. 

Investir em formação para poder ter capacidade de ampliar o acesso e a qualidade do atendimento, pode representar, no médio e no longo prazo mais qualidade de vida para o paciente e menos custos para o sistema. 

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