O papel está voltando. E não é só por saudosismo
Imagem: Reprodução/Internet

O papel está voltando. E não é só por saudosismo

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Autor: Guilherme Vicente de Morais

Durante muito tempo, nos disseram que o impresso estava morrendo. Que os livros iriam desaparecer. Que as revistas seriam peças de museu. Que o papel, em um mundo dominado por telas, se tornaria obsoleto. Mas, ironicamente, quanto mais o digital se expande, mais o físico volta a fazer sentido.

O impresso está voltando. E não é só por nostalgia, é por estratégia.

Nas prateleiras de grandes empresas e nos corredores do marketing contemporâneo, há uma movimentação silenciosa, mas poderosa: a redescoberta do papel como mídia de valor. Marcas visionárias estão lançando publicações autorais, catálogos editoriais, livros-manifesto e revistas de conteúdo proprietário. Não se trata de uma volta ao passado. Trata-se de um salto para o futuro, com os dois pés fincados na experiência real.

O papel virou símbolo de presença. Enquanto o digital fragmenta, notifica e nos faz deslizar os dedos sem parar, o impresso convida à pausa. Um livro não compete com mil abas abertas. Uma revista não aparece entre dois stories. Quando você entrega um conteúdo impresso nas mãos de alguém, está dizendo: “isso importa, isso foi feito para durar”.

E isso tem um peso enorme em um mercado saturado por efemeridade.

Há pouco tempo, a Amazon, aquela mesma que nos ensinou a comprar tudo com um clique, lançou uma coleção de revistas físicas com curadoria editorial. A Wired, ícone da cultura tech, voltou a imprimir edições limitadas com foco em experiência sensorial. E aqui mesmo no Brasil, startups, instituições e até grandes players do agronegócio estão criando publicações impressas para estreitar vínculos com seus públicos.

É um movimento que desafia o imediatismo. Enquanto tudo acontece em tempo real, o papel nos reconecta com o tempo lento, com o gesto cuidadoso, com o desejo de permanência. Não há botão de pular. Não há “skip ad”. Há o virar da página, o cheiro da tinta, o som sutil do papel se movimentando entre os dedos. Experiência. Presença. Intenção.

A explicação é simples: o que é raro ganha valor. E o papel, hoje, é raro.

Em tempos de overdose digital, o conteúdo impresso virou luxo. Luxo não no sentido de ostentação, mas de atenção. E atenção virou a moeda mais valiosa do marketing. Quando uma marca entrega uma revista bem feita, um livro com propósito ou um jornal institucional com curadoria, ela está dizendo: “não quero só aparecer para você, quero fazer parte da sua estante, da sua sala, da sua vida”.

É também uma forma de recuperar confiança. Em um ambiente tomado por fake news, deep fakes, algoritmos manipuláveis e conteúdos de curtíssima vida útil, o papel recupera algo que anda em falta: credibilidade. O que é impresso passa por mais camadas de revisão, exige mais responsabilidade e é percebido como mais legítimo. Não é à toa que muitas marcas estão apostando no impresso para construir autoridade. Não para viralizar, mas para ficar.

Aqui na Escreva, temos visto isso de perto. Autores que publicam livros não apenas para vender, mas para marcar presença. Instituições que criam revistas para deixar legado. Negócios que entendem o impresso como um diferencial competitivo no relacionamento com seus stakeholders. E, claro, leitores que valorizam cada página como quem encontra um tempo que não existe mais.

É curioso pensar que, num mundo de tanta inovação, o novo diferencial esteja naquilo que parecia ultrapassado. Mas talvez seja justamente aí que esteja a mágica: no reencontro com o que é essencial. E poucas coisas são tão essenciais quanto o toque, o cheiro, a permanência e o silêncio que um conteúdo impresso carrega.

O papel não morreu. Ele só estava esperando o momento certo para ser redescoberto, com mais sentido, mais propósito e mais estratégia. 

Guilherme Vicente de Morais

Guilherme Vicente de Morais é sócio-fundador da Editora Escreva. Produtor cultural, escritor e jornalista especializado em comunicação, marketing e posicionamento.

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