Colunista: Guilherme Vicente de Morais
Na era dos algoritmos, o silêncio também comunica. E, muitas vezes, fala muito mais alto do que podemos imaginar. Você pode ter uma marca alinhada com causas sociais, campanhas plurais, uma linguagem inclusiva e um bom manual de conduta. Mas, se seu anúncio aparece entre dois vídeos recheados de discurso de ódio, fake news ou misoginia, é como se você estivesse apertando a mão de quem nega tudo aquilo que você defende. E o pior: na frente de todo mundo.
Brand Suitability. Este é o nome do novo, e necessário, debate que está tirando o sono de agências, anunciantes e CMOs. Mais do que se preocupar apenas com a segurança da marca (brand safety, que evita que seu conteúdo esteja ligado a pornografia, violência explícita ou terrorismo), agora o jogo é mais sutil e mais perigoso: em que tipo de ambiente sua marca se sente confortável para aparecer?
Não se trata de censura e sim de estratégia. Num cenário cada vez mais polarizado, veloz e tóxico, não basta mais comunicar bem. É preciso comunicar com coerência. E isso inclui avaliar não só o que você diz, mas onde você diz, com quem você diz, e com quem você aparece lado a lado nas plataformas digitais.
Plataformas como o X, o antigo Twitter, reduziram drasticamente suas políticas de moderação. O resultado? Grandes marcas começaram a ver seus anúncios sendo exibidos ao lado de publicações racistas ou extremistas. Gigantes como Coca-Cola, GM e Disney pausaram campanhas. Não por serem boazinhas, mas porque reputação é algo que leva-se anos para construir, e pode ser destruído em segundos.
A lógica do marketing mudou. O jogo não é mais apenas sobre alcance e conversão. É sobre confiança.
E confiança nasce da coerência. O consumidor está cada vez mais atento. Ele repara onde você investe, quem você patrocina, com quem você colabora. E, sim, ele julga, e com razão. Porque quando uma marca fala sobre diversidade no feed, mas anuncia em canais que promovem machismo e xenofobia, o que sobra é a incoerência disfarçada de distração.
Engajamento a qualquer custo não é mais aceitável. Durante muito tempo, o marketing foi movido pela métrica do impacto: quem viu, quem clicou, quem converteu. Mas nem todo clique vale o preço. Nem todo view compensa o dano. A viralização vazia pode ser um presente de grego para marcas que desejam construir valor de longo prazo.
É hora de resgatar a inteligência estratégica. Voltar a fazer perguntas incômodas: o que realmente combina com os valores da minha marca? Em que tipo de ambiente quero ser lembrado? Com quais vozes quero dividir o mesmo espaço?
Isso não significa isolar-se em bolhas. Significa escolher com consciência. Curar parcerias. Avaliar ambientes. Revisar campanhas programáticas. E, acima de tudo, entender que tudo comunica, inclusive o contexto em que estamos inseridos.
A boa notícia é que o mercado está se mexendo. Iniciativas como a GARM (Global Alliance for Responsible Media) tentam criar parâmetros de adequação. Plataformas sérias já oferecem filtros de conteúdo mais refinados. E empresas com visão estão investindo em curadoria ativa, análise preditiva e presença intencional.
Na Editora Escreva, por exemplo, temos defendido, na prática, uma comunicação com alma, propósito e posicionamento real. Porque narrativa boa não é só aquela que se lê ou se ouve. É aquela que se percebe e precede, que se sente, que ressoa com a experiência. E isso passa por algo simples e profundo: coerência. Estar onde faz sentido. Comunicar com quem partilha valores. Aparecer com quem respeita o outro.
O momento é de falar menos e escolher minuciosamente onde aparecer.

Guilherme Vicente de Morais
É sócio-fundador da Editora Escreva. Produtor cultural, escritor e jornalista especializado em comunicação, marketing e posicionamento.